Staycation. Uma rápida busca por tendências na hotelaria ou práticas para ajudar no enfrentamento da crise que se instalou no setor em virtude da pandemia, aponta para esse termo não muito conhecido por terras brasileiras até ano passado.
Mas, o que é staycation? O staycation pode ser informalmente definido como um ‘sair de férias em casa’ ou ‘ser turista na sua própria cidade’. Talvez mais conhecido por alguns como turismo doméstico, o conceito ganhou força no Brasil nesse último ano.
Muitos empreendimentos hoteleiros, em virtude das diversas restrições da pandemia – como os cancelamentos e alterações nas viagens e deslocamentos – começaram a focar suas estratégias no público local como alternativa para manter a ocupação e gerar receita.
Fato é que muitos hoteleiros voltaram suas ofertas para o turista que mora ao lado, na mesma cidade ou em região bem próxima. Esse movimento dos turistas foi captado pelo mercado e, como esperado, levou ao desenvolvimento de ofertas para atender esse público, que precisava e podia sair um pouco de casa para ‘respirar novos ares’, respeitando todos os protocolos.
Para compensar o período de portas fechadas, os hotéis, que criaram serviços e experiências atrativas para seus conterrâneos, têm conseguido recuperar um pouco do prejuízo e manter suas taxas e receitas um pouco mais equilibradas.
Você é um dos que ‘vem surfando essa onda’? Ainda não?
O staycation veio para ficar
Estamos vivendo tempos que clamam pela reinvenção do setor turístico e hoteleiro. O staycation é uma das tendências que, com certeza, veio para ficar. Vou explicar.
Lembra da rápida busca que falei lá no início? Mesmo sendo um termo já bem conhecido no exterior, a estratégia de focar no turismo local tem sido bastante adotada atualmente pelo mundo todo.
Dados e fatos sobre o staycation
- Um artigo da Bloomberg de dezembro de 2020 já previa que os staycationers (adeptos ao staycation) poderiam impulsionar as taxas de ocupação nos Estados Unidos e na Europa em até 25%, se comparadas às taxas de abril do mesmo ano.
- Um outro artigo americano de outubro de 2020 traz o staycation como salvador da pátria dos hotéis da cidade de Los Angeles. O Gerente de Marketing do The Ritz-Carlton Los Angeles disse que ‘o modelo de negócio ao qual estamos habituados desapareceu do dia para a noite’. Assim, os hotéis da cidade mudaram suas estratégias e viram sua ocupação subir com ‘turistas locais ansiosos por um tempo fora de casa’. O órgão de turismo da cidade, inclusive, fez uma ação especial para impulsionar o staycation: a ‘LA Love’, campanha na qual os turistas têm acesso a inúmeras ofertas, incluindo descontos em diárias e alimentação em hotéis.
- O site UOL, em novembro de 2020, trouxe um levantamento do site de reservas de hotéis Booking, que dizia que 55% dos brasileiros planejavam viajar dentro da região que moram dentro de um período de 7 a 12 meses. Alertou, ainda, que a demanda reprimida de viagens mais distantes acabou sendo canalizada para o turismo local.
- O blog Hotel Inspectors, da Panrotas, também abordou o tema de como as ‘escapadas possíveis’ vêm ajudando muito a hotelaria a se recuperar dentro do cenário que vivemos hoje. Também fala de como esse tipo de viagem deixa o turista mais no controle da situação e, de certa forma, minimiza a percepção de risco.
Portanto, esses relatos ilustram o cenário favorável ao turismo doméstico e como a hotelaria tem tirado proveito e pode se beneficiar desse movimento.
Para falar sobre o turismo na pandemia e o Turismo Regional, convidamos Tiago Lima, fundador da Trip Tri, a maior comunidade de viajantes do Sul do Brasil. Escute o episódio do Podcast aqui:
Muitos hotéis brasileiros, principalmente os paulistas e os cariocas – que saíram ‘surfando essa onda’ na dianteira- começaram oferecendo pacotes de serviços e experiência especialmente desenhadas para aquelas pessoas que moram a poucos quilômetros. Hoje, o movimento pode ser percebido na hotelaria de todo país.
Criando uma oferta para o seu público local
Do day use ao extended stay: como o staycation ajuda o seu hotel a se recuperar nesse período
Revisitando os conceitos básicos:
- Day Use: modalidade de serviço na qual o hóspede pode usufruir das áreas e serviços do hotel, sem o pernoite incluído. Por um valor inferior ao da diária, é possível desfrutar de piscinas, spas, restaurantes e demais estruturas do hotel, como se estivesse hospedado.
- Extended Stay: também conhecida como long stay, é a estadia prolongada, que também teve um crescimento notável dentro do período da pandemia, especialmente para meios de hospedagem com espaço ao ar livre, em meio à natureza e com acomodações que favoreçam o isolamento social.
Assim, o Day Use pode ser a porta de entrada para que os turistas domésticos conheçam o hotel e tenham experiências agradáveis que despertem o desejo de retornar – ou esticar – para uma hospedagem por período maior. Ou seja, uma coisa pode levar à outra!
Nota-se, hoje em dia, um uso mais estratégico desse tipo de diária, que, por muito tempo, foi vista apenas como uma alternativa para fazer receita em períodos ociosos – baixa temporada, dias específicos com menor ocupação etc. Uma oferta de Day Use com o objetivo de captar novos hóspedes e agregar valor ao meio de hospedagem é uma escolha mais acertada dentro do cenário atual do que meramente lotar o hotel de ‘hóspedes por um dia’ em busca de receita imediata.
Cuidados na oferta de Day Use
Para criar uma oferta de Day Use para seu meio de hospedagem, recomendo alguns cuidados:
→ Ter em mente para que público ela será direcionada e o que esse perfil valoriza: se é exclusividade, descanso, isolamento, etc. O ideal é estudar como e se o seu empreendimento pode suprir essas demandas.
→ Oferecer serviços onde os hóspedes possam, naquele espaço de tempo, aproveitar o que de melhor o local tem para lhes proporcionar. Para tornar o Day Use atrativo e rentável, os hotéis têm apostado em pacotes de experiências diferenciadas – das gastronômicas às de lazer, bem-estar, de room office e outras que surgem a todo momento. Os hoteleiros têm se esforçado para oferecer serviços diferentes com os recursos que o seu hotel dispõe.
→ Deixar a oferta bem clara e alinhada – com o hóspede e com a sua equipe. Definir :
- o que será disponibilizado para o hóspede
- em qual a faixa de horário ele poderá usufruir da estrutura,
- quais comodidades e mimos ele receberá durante o período e
- como ele será informado de tudo
Tudo isso são pontos importantes a serem planejados.
Alinhar como a operação interna também se comportará no atendimento dos “hóspedes por um dia” é algo igualmente importante (como será feito o controle de acesso, consumo etc). Esse planejamento é para evitar qualquer impacto negativo na percepção do serviço por parte do cliente.
Até porque, o efeito que você busca despertar é totalmente o contrário! É ir além do positivo, cativar esse hóspede que veio conhecer sua estrutura e deixar aquele ‘gostinho de quero mais’.
A dica chave aqui é aproveitar a tendência do turismo doméstico ao seu favor e se tornar um local onde as pessoas queiram estar com frequência, seja por um período do dia, seja para um almoço ou jantar, um final de semana ou mais!
Para isso, é preciso pensar a longo prazo, na fidelização desse hóspede.
Para se tornar o objeto de desejo do turista local, eu aconselho você a não vender uma díaria e, sim, vender uma experiência.
Diária x Experiência
Tem diferença? Claro! A cada dia que passa o setor hoteleiro vem deixando de ser um setor de serviços para se tornar um setor de experiências.
Isso tem nome e teoria: Economia da experiência, de Pine e Gilmore. E não é algo novo, mesmo sendo um pouco mais recente na hotelaria . Ela já está em prática há muitos anos na Disney, referência quando o assunto é experiência do cliente.
Em resumo, qualidade e satisfação passam a ser o novo ‘mínimo’ aceitável. Os clientes desejam experiências memoráveis para chamar de suas, algo além do nível ‘serviço’. Eles querem um patamar superior dentro de uma escala de progressão do valor econômico: o da ‘experiência’.
Os hóspedes de hoje não enxergam os hotéis apenas pela ótica de ‘estou pagando para ter acesso a um quarto com uma infraestrutura satisfatória’ . Eles querem acesso a uma experiência: uma acolhida no check in, um mimo na chegada do quarto, um serviço que supere as expectativas, etc. E isso não é o esperado somente em um hotel de luxo!
Se isso já vinha acontecendo antes da pandemia, agora, mais do que nunca, os hóspedes não estão atrás apenas de um quarto. Eles querem vivenciar algo diferente de suas rotinas, do isolamento e de tudo que ele impôs.
Entender o movimento do staycation e como ele pode ser trabalhado no seu empreendimento, pela criação de ofertas de Day Use, Extended Stay e outras várias que já vem sendo praticadas pelo mercado, é essencial para a sobrevivência do negócio.
A jornada do Day Use ao Staycation
Pense comigo: você cria um pacote de Day Use tão maravilhoso que seu hóspede fica muito encantado, a ponto de já querer esticar a visita e pernoitar. Isso é bom, certo?
Além disso, você também cria um pacote para estimular mais pernoites: ficando 3 noites, a 4ª diária é free. Seu hóspede, já impressionado com a experiência do Day Use, topa na hora esticar a estadia! E depois da 4ª diária, ele sai e recomenda o hotel para meio mundo de gente e ainda retorna, se tornando um habitué da casa.
É uma reação em cadeia.
Por isso, devemos planejar tudo com o máximo cuidado, para dar certo desde a primeira impressão! Os hóspedes estão cada dia mais exigentes, mas igualmente dispostos a pagar mais para ter acesso a ofertas diferenciadas.
8 exemplos de staycation no Brasil
Para finalizar, trago aqui para vocês um compilado de hotéis brasileiros que se destacaram na mídia com suas ofertas voltadas aos adeptos de staycation:
1) Renaissance São Paulo Hotel: pacote Staycation, onde o hóspede escolhia dois benefícios extras na diária, como café da manhã, desconto em A&B, estacionamento, late checkout etc.
2) Palácio Tangará: criou um espaço ao ar livre, o Pateo do Palácio, que serve pratos e drinks e com música ao vivo nos finais de semana e recreação infantil todos os dias. O hotel também ofereceu descontos para mais incentivar uma estadia mais longa e criou pacotes de experiências bem interessantes.
3) Hilton (SP e RJ): campanha Viaje com Tranquilidade, que garante a brasileiros 25% de desconto na tarifa, estacionamento, café da manhã e late check-out.
4) Wyndham Gramado (RS): promoção ‘Wyndham Gramado Dá um Gás para Você’, que distribuiu vouchers de combustível para incentivar o turismo regional e viu o movimento de turistas da região Sul crescer na reabertura.
5) Fasano São Paulo: programas especiais de hospedagem para fomentar o turismo nacional e proporcionar uma experiência especial, com o Experimente São Paulo e ao One More Night.
6) Fairmont Rio de Janeiro: promoção “Carioca”, que dava aos moradores da cidade descontos de até 30% para se hospedarem no local.
7) Santa Teresa MGallery (Rio de Janeiro): ofereceu uma opção de day use combinando spa e uso da piscina com almoço no restaurante Térèze. Oferece ainda pacotes de experiências, que incluem passeios e atividades exclusivas no bairro e arredores.
8) Deville Prime Salvador: promoção ‘Escapadas em Salvador’, com uma chamada de ‘Viaje sem sair da sua cidade’, oferecendo 20% off nas diárias.
Quem sabe um benchmarking disfarçado de staycation – ou vice-versa – não seja uma boa para entender melhor como aplicar a estratégia no seu negócio?
Gostou do artigo? Compartilhe com a sua rede essa nova tendência!
Sobre a autora: Thais Bandinelli é Administradora & Especialista em Gestão Hoteleira, Mestranda em Turismo e Hotelaria, apaixonada pelo estudo da Hospitalidade e da Gestão da Experiência do Hóspede. Pelo perfil @hospitalidadedigital no Instagram, compartilha dicas de gestão e hospitalidade para hotéis e empresas com atitude hospitaleira e oferece serviços de cliente oculto para hotelaria, diagnóstico organizacional, mentoria e treinamentos.